segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

A Fada Açucarada e outras reflexões.



Tenho visto muitos espetáculos escolares no fim do ano. Muitos mesmo.
Pude ver coisas surpreendentemente boas, espetáculos belíssimos, e coisas desastrosas.
Mas algo me incomodou profundamente. Será que o afã da inclusão não acaba por expor o indivíduo a uma situação de constrangimento que na verdade seria desnecessária?
Vou explicar. Vi recentemente um espetáculo de dança onde uma criança espástica era solista. Na verdade a solista era a professora. A criança não podia fazer nada, pois, como já disse, era espástica. Não podia expressar-se através de movimentos, de consequência, não podia dançar.
Mas era a solista.
Foi aplaudida, como a boa educação manda que seja, mas na verdade, me perguntei o que se aplaudia? A performance ou a pena que se sentia dela? Será que aquilo era dança? Será que aquela exposição excessiva de fato fez e faz bem à criança? Será que ela merecia ser aplaudida por pena?
Me fez pensar que um bom professor respeita os limites e as deficiências de seus alunos. Que os protege, compensando as limitações com outras habilidades. Mas ali, não havia nada. Só uma penosa demonstração de ajuste social forçado pelas convenções “modernas” de inclusão.
Vou ser execrada por falar isto, parecendo que não tenho suficiente sensibilidade. Mas pode ser que talvez seja justamente por ser sensível demais, que sinta aquela exagerada exposição como uma agressão. Não consigo compactuar com uma fraude, menos ainda com um abuso.
De fato, não gosto de tudo o que eu vejo e que insistem em me “vender” como Arte. Muitas vezes me parece mais a estorinha da roupa nova do rei. Para não se passar por idiota, mal informado, politicamente incorreto, insensível, o sujeito aplaude o nada. O nada mesmo.
Como a maioria das pessoas se impressiona com meia dúzia de nomes impronunciáveis e uma ou outra referência, aceita opiniões formadas sobre aquilo que não domina e passa a aceitar discursos pomposos, ignorando as próprias ideias e convicções por medo do ridículo. Cansei de ver nos meios “intelectualoides” o nada elevado a paradigma. Gente incensando o vazio para não passar por desinformado.
Alguns, em boa fé até, dirão:-“Foi feito pela criança!”. Mas eu digo que não. Foi feito pela vaidade dos pais, dos professores, de nossa sociedade implacável, que exige competências onde estas competências não existem. Todos nós temos talentos e habilidades, mas todos temos limitações também. Reconhecer nossas limitações é parte de aprendermos a viver felizes e livres das convenções. É inútil insistir em algo que vai além do possível.
Interessante que aprendi esta visão, não nos museus ou nos palcos, mas nas UTIs onde trabalhei. Vendo os abusos e as futilidades cometidas em nome da sobrevida a qualquer custo. Custo alto em sofrimento humano.
Até quando vamos forçar as situações para colocarmos nossas consciências em paz? Quando vamos aprender a valorizar os nossos limites? Quando aceitaremos o que nossa condição humana nos impõe?
PS: Quero deixar registrado que vi outras crianças “diferentemente hábeis” realizando excelentes performances. A diferença foi o bom senso dos professores.

Um comentário:

  1. Aplaudo a sua coragem. Falar sobre estas coisas e sermos obrigados a nos conduzir politicamente corretos, eticamente corretos, etceteramente corretos nos impõem amarras no que pensamos e passamos a ser marionetes, mas nem sabemos direito do quê ou de quem, já que todo mundo aplaude o mesmo vazio. Parabéns.

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